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Uma Análise do Estudo de De Vries

A busca por entender por que alguns líderes são eficazes em certas situações e não em outras é um dos temas centrais dos estudos organizacionais. Por décadas, teorias de liderança situacional, como a Teoria da Contingência de Fiedler e a Teoria do Caminho-Objetivo de House, propuseram que fatores contextuais (como a tarefa, a organização e os próprios subordinados) moderam a relação entre o comportamento do líder e os resultados da equipe. No entanto, os resultados empíricos têm sido, em geral, decepcionantes, com poucos efeitos moderadores significativos encontrados.
Diante desse cenário, o estudo de De Vries, Roe e Taillieu (2002) propõe uma abordagem mais simples e parcimoniosa. Os autores argumentam que a variedade de fatores situacionais pode ter seu efeito resumido em um único conceito proximal: a "Necessidade de Liderança" (Need for Leadership - NFL) dos subordinados. Esta seria uma variável "guarda-chuva" que medeia a influência de outros fatores contextuais. A hipótese central do artigo é que a NFL modera a relação entre as características de liderança e os resultados dos funcionários: quando a NFL é alta, a liderança é mais fortemente relacionada aos resultados positivos; quando é baixa, essa relação é mais fraca.
Os pesquisadores testaram sua hipótese com uma amostra robusta e diversificada de 958 funcionários holandeses de várias organizações e setores. A análise revelou descobertas nuances que dialogam diretamente com modelos clássicos de liderança.
10 Pontos Principais do Estudo e seus Paralelos com a Prática
O julgamento do subordinado é crucial. A NFL não é sobre a tarefa em si, mas sobre a percepção do funcionário sobre sua própria necessidade de apoio. É como se a Teoria do Caminho-Objetivo ganhasse vida: a eficácia do líder está justamente em clarificar o caminho, mas só faz sentido investir nisso se o funcionário precisar dessa clarificação.
Contexto importa, mas não é tudo. A pesquisa encontrou alguns efeitos moderadores, mas eles foram mais sutis do que se esperava. Isso mostra que, assim como na teoria dos Substitutos da Liderança, o contexto pode reduzir a importância do líder, mas raramente a anula completamente – a liderança ainda tem um papel fundamental.
Um líder solidário quase nunca é demais. O "Suporte do Líder" – aquele comportamento focado no bem-estar da equipe – mostrou-se benéfico para a satisfação e o comprometimento quase independentemente da situação. Esse é um pilar da Liderança Transformacional e do Modelo de Ohio que se confirma: ser um líder humanizado e acessível é quase sempre a base certa.
Controlar demais pode sufocar. Já o comportamento de "Estrutura" – focado em planejamento e controle – mostrou-se uma faca de dois gumes. Ele pode aumentar o estresse. O paralelo com a Liderança Situacional é claro: microgerenciar um profissional experiente e autônomo (com baixa NFL) é receita para insatisfação, enquanto para um novato (alta NFL), essa mesma direção é essencial para sua segurança e comprometimento.
O líder raramente "atrapalha". Uma descoberta interessante é que a NFL geralmente não torna a liderança negativa; ela apenas fortalece ou enfraquece seu impacto. Dificilmente um bom líder se tornará um estorvo só porque a equipe é autossuficiente, o que modera visões mais radicais que pregam a total irrelevância da liderança em certos contextos.
O carisma pode criar dependência. Curiosamente, funcionários com alta NFL tendiam a ver seus líderes como mais carismáticos. Isso desafia a visão idealizada de que o líder transformacional sempre empodera. Na prática, seu carisma pode, em alguns casos, gerar uma relação de dependência, onde os subordinados passam a "precisar" daquela figura inspiradora.
A necessidade de liderança é dinâmica. A NFL não é um traço de personalidade, mas um estado que muda conforme a circunstância, a competência e a confiança do funcionário. Um profissional pode ter baixa NFL em sua rotina, mas uma necessidade alta num projeto novo e desafiador. Um líder situacional de verdade é aquele que percebe essas mudanças e ajusta sua conduta.
Medir desempenho é um desafio complexo. O estudo usou autoavaliação de desempenho, e uma descoberta intrigante foi que funcionários que se avaliaram como muito competentes tenderam a classificar seu líder como menos inspirador. Isso pode indicar um "efeito de comparação", onde a autoconfiança elevada leva a uma visão mais crítica da liderança, mostrando como as percepções são interligadas e subjetivas.
A lição prática é a sensibilidade. A grande lição para qualquer líder é a importância de diagnosticar a equipe. Enquanto oferecer suporte é quase sempre uma boa aposta, a dose de controle e direção deve ser administrada com cuidado, baseando-se na necessidade percebida de cada membro da equipe. Não se trata de adotar um estilo único, mas de adaptar-se.
Simplificar para entender melhor. A grande contribuição do estudo foi propor a NFL como um conceito unificador. Em vez de se perder em uma infinidade de variáveis situacionais (task ambiguity, rotina, feedback da tarefa), olhar para a "necessidade de liderança" oferece uma lente mais simples e direta para entender quando a influência de um líder será mais ou menos eficaz.
O estudo de De Vries et al. reforça a ideia de que a liderança eficaz não é sobre aplicar um estilo universal, mas sobre a sensibilidade do líder em perceber e responder ao que seus subordinados realmente precisam naquele momento – um princípio que permanece no cerne das melhores práticas de gestão de pessoas hoje.
Fontes:
De Vries, R. E., Roe, R. A., & Taillieu, T. C. B. (2002). Need for leadership as a moderator of the relationships between leadership and employee outcomes. The Leadership Quarterly, 13(1), 121-137.
Modelos de Liderança Citados:
Teoria do Caminho-Objetivo (House, 1971)
Teoria da Contingência (Fiedler, 1967)
Teoria dos Substitutos da Liderança (Kerr & Jermier, 1978)
Liderança Situacional (Hersey & Blanchard, 1969)
Liderança Transformacional (Bass, 1985)
Modelo de Ohio (Iniciação de Estrutura e Consideração)